quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

A Privatização da Ponta do Coral ou por que lutar por um destino público naquele espaço.

A população de Florianópolis está assistindo a mais uma bem orquestrada ação de privatização de uma área nobre da cidade e que deveria ter um destino público. Esta ação começou há muitos anos, quando uma parte do terreno público que pertencia ao antigo Abrigo de Menores (destruído por um incêndio)foi "vendida" pelo governo do estado (Fucabem) a uma empresa privada de Criciúma.
(acervo Casa da Memória)
A porção do terreno privatizada se constituía na parte mais valorizada, entre a nova avenida construída pelo próprio governo estadual e o mar. Desde então projetos têm vindo à publico (invariavelmente de hotéis de alto luxo) e ano passado a empresa Hantei apresentou um novo projeto, desta vez acrescido de um aterro equivalente à área do terreno; uma parcela da população tem denunciado e protestado contra esta ação de subtração de um patrimônio paisgístico numa cidade que aspira por espaços públicos de qualidade. Há inclusive denúncias que a lei municipal que mudou o zonemanento para a viabilização do empreendimento (lei 180/2005) seja irregular. O mais grave do "concerto" é que as pessoas que ocupam os cargos públicos se esforçam para viabilizar o projeto privado, desprovidos de qualquer espírito público, numa grave ação de delapidação do patrimônio  da cidade.

Embora muito preocupado, não estou surpreso com esta ação. A composição do poder municipal atual e de administrações anteriores tem demonstrado o quanto suas ações são contraditórias em relação à construção de uma cidade para seus habitantes e a um comprometimento com a coisa pública. A estratégia é conhecida e antiga; abandonam o espaço público para que a população prefira qualquer outra coisa no local que se torna inseguro e inóspito para o uso público; depois, com belas imagens (a computação gráfica serve para tudo) e com um bem orquestrado programa de mídia, mostram uma paisagem futura como se fosse a única possível, pois não se tem recursos para a construção de um parque (SIC!); depois, toda a máquina pública trabalha a favor do projeto e qualquer voz dissonante(de dentro ou de fora da administração pública) deve ser deslegitamada. Não tenho dúvida que desta administração, nenhuma outra proposta poderia surgir; ela não quer espaços públicos (não consegue enxergar sequer que eles são importantes para criar amenidades e valorizar o próprio capital imobiliário); não quer planos que reservem espaços públicos pois dificultam a ação especuativa.
Não tenho dúvidas que a interrupção do processo participativo do Plano Diretor de Florianópolis aconteceu porque outro modelo de cidade estava germinando; várias comunidades demandaram espaços públicos, indicando inclusive onde seriam implantados: Campeche (Campo de aviação, Lagoa da Chica e Lagoa Pequena); Lagoa (Vassourão); Pântano do Sul; Coqueiros (ampliação do parque existente); área da Penitenciária; Parque do Rio Vermelho, Costa da Lagoa. Outras comunidades apontaram a necessidade de áreas públicas sem, no entanto, indicar local: Ratones, Ribeirão da Ilha, Saco Grande, Santo Antônio de Lisboa ; Barra da Lagoa, Cachoeira do Bom Jesus, Canasvieiras, Continente, Costeira do Pirajubaé e Ingleses.
Não bastasse a demanda da população, a administração ignora relações importantes entre a construção de um hotel de 600 leitos e a (i)mobilidade urbana, um dos principais problemas da cidade. Um hotel desta magnitude é um pólo gerador de tráfego de grande proporção. Depois certamente virá a solução: construir mais um viaduto (sic!).
A ação dos movimentos sociais, desde a década de 80 tem sido importante para tentar impedir este uso privado de área de grande interesse público. É uma ação de Resistência. Atrevería-me a dizer que a construção deste hotel na Ponta do Coral seria a destruição do Miramar do século XXI, afinal, as consequências seriam muito parecidas: afastar a população do mar.
Para terminar, apresento algumas imagens de parques públicos que valorizam a paisagem e a população local; os turistas TAMBÉM aproveitam, mas não são o únicos a usufrir, como querem nossos adminstradores.
(França; obsevem a semelhança com a Ponta do Coral. Eles mantiveram o espaço público)
Le Parc Areca %uFFFD Saint-Aygulf
Parc Areca (também França)
Parc Jean Drapeau (Montreal): a dimensão é outra, mas o aspecto urbano é o mesmo.

É preciso resistir e mostrar alternativas ao modelo de Cidade-Mercado que querem nos impôr.

6 comentários:

  1. Elson, o artigo amplia a convicção de que a Ponta do Coral é inegociável. Lutemos em nome das geraçoes futuras. Parabéns!

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  2. Se analisarmos mais profundamente os problemas de Florianópolis e de sua região de influência veremos que grande parte deles têm sua gênese no tipo de planejamento urbano que se pratica, quase sempre voltado ao mercado imobiliário. O que falta para termos uma cidade com qualidade de vida? Talvez a resposta seja espírito público para nossos governantes e para nós mesmos. Estamos alheios à política urbana, reclamando dos intermináveis congestionamentos sem saber que nosso descaso contribui para eles. Precisamos acordar para questões que estão saltando aos olhos. É preciso participação popular ativa em decisões que interessam a todos. O novo projeto mirabolante para a Ponta do Coral é um exemplo emblemático da mercantilização de Florianópolis. Não é apenas um espaço público que se perde, é o nosso aval ao crescimento predatório da cidade. Vamos defender a Ponta do Coral, defendendo, assim, nosso próprio espírito público! Parabéns ao Prof. Elson pelo brilhante artigo!

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  3. A privatização de mais uma área pública de Fpolis também não me surpreende.Como citado pelo Prof. Elson, a interrupção do Plano Diretor Participativo é uma prova de que o modelo planejado para a capital caminha pelo vies dos interesses privados e não dos anseios das comunidades. Querem prova maior que o tema da mobilidade urbana?Para a administração atual é muito "mais viável" construir viadutos isolados pelo município e planejar a 4a ponte, do que investir, por exemplo, num sistema de transporte público de qualidade, seja rodoviário e/ou hidroviário... Enfim, poderia citar muitos outros "maus" exemplos. Prefiro lembrar que este ano temos as eleições municipais!

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  4. Como que um empreendimento que irá gerar um PARQUE PÚBLICO junto à orla, MARINA e PÍERES, inclusive para pescadores, irá "afastar a população do mar"??? É justamente a cidade se redimindo dos aterros mal-aproveitados pelo poder público, da demolição do Miramar e se reconciliando com sua tradição marinheira!!!

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  5. Sugiro que "os do contra" apresentem o "Habite-se" de suas residências. Porque é muito comum pessoas falarem em Especulação imobiliária, ocupação irregular, plano diretor etc, mas moram em servidões clandestinas, em APPs, APLs e constroem sem licenciamento. Pregam moral de cuecas.

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  6. Gostaria de ver todos aqui participando das novas audiências públicas para discussão do novo Plano Diretor de Florianópolis que devem acontecer nos próximos dias. Vamos ficar atentos que é a última chance!

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